A cada reportagem no site do Correio sobre minorias sociais, étnicas ou sexuais, o comportamento se repete. Nas caixas de comentários do Facebook, os reis de curtidas costumam ser as variações mais rudimentares de “obrigado por não mudar minha vida”, “mas tem que ver a verdade disso aí”, “por que não falam sobre os homicídios do homem branco heterossexual?”.
A esse comentarista, uma má notícia: tamanha ojeriza por determinado assunto te mantém sitiado. Os algoritmos que fizeram do Facebook a rede social mais movimentada do mundo constroem suas bolhas de conteúdo baseadas no interesse do usuário — e, como qualquer robô, são incapazes de entender se sua relação é de amor ou ódio com aquele tema. Em termos práticos, quanto mais você xingar dinossauros, mais vezes eles estarão na sua tela.
Essa tendência se reforçou desde o fim da semana passada, quando o Facebook fez a primeira grande atualização do algoritmo em 2017. Agora, o conteúdo exibido na linha do tempo do usuário virá principalmente das ações dos amigos, deixando menos espaço para as páginas que não patrocinem conteúdo. Em termos práticos, se você seguir xingando dinossauros depois disso, mais vezes ainda eles estarão na sua tela.
Nossos hábitos de navegação alimentam essa bolha. Se eu e você temos os mesmos 500 amigos, o que curtimos e comentamos fará com que, em poucos dias, apareça um conteúdo totalmente diferente para cada um. Eis a bolha em funcionamento.
Depois que entendemos o funcionamento dela, a existência não se torna necessariamente ruim. A bolha surge para preservar nossa sanidade mental. É algo que sempre existiu — ou nossos avós escolhiam seus compadres priorizando a falta de afinidade? —, mas agora é manipulada por programadores que se aproveitam do sistemático furto dos dados pessoais que colocamos à disposição dos gigantes da tecnologia global.
O efeito irremediável dos insultos do Facebook é o de te integrar na bolha alheia. Como no último dos Doze contos peregrinos de Gabriel García Márquez, cada comentário publicado é como um rastro de sangue deixado na neve. E pode ser tarde demais quando for descoberto o motivo da hemorragia.
Artigo publicado no Correio Braziliense de 16 de janeiro de 2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário